Empresas revisam políticas pós-pandemia, e especialistas alertam para riscos jurídicos e disputas trabalhistas
Cinco anos após adotar o modelo 100% remoto, o Nubank anunciou uma mudança significativa na sua política de trabalho. A partir de julho de 2026, os funcionários da fintech — que hoje soma 122 milhões de clientes e atuação em três países — deverão adotar o regime híbrido, com dois dias presenciais por semana, ampliando para três dias a partir de janeiro de 2027.
O movimento segue uma tendência que já alcança outras grandes instituições. Em junho deste ano, a Caixa Econômica Federal também revisou suas regras de teletrabalho, limitando o home office a dois dias por semana e exigindo que os empregados utilizem equipamentos próprios. A medida, em vigor desde julho, provocou reação de entidades representativas e reacendeu o debate sobre os limites legais e impactos trabalhistas das mudanças no regime remoto.
Disputas judiciais podem aumentar
Para a advogada Paloma Vallory, sócia do escritório Ferreira Borges, a retomada presencial precisa ser conduzida com amparo jurídico, sob pena de abrir espaço para ações trabalhistas por alteração contratual lesiva.
“Se o trabalho remoto foi previsto desde a contratação — e o profissional organizou sua vida em torno dessa realidade —, o retorno obrigatório sem negociação prévia pode ser questionado na Justiça”, explica.
Segundo ela, tanto a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) quanto a Lei nº 14.442/2022, que regulamenta o teletrabalho, determinam que mudanças de regime devem respeitar o acordo individual firmado e não podem gerar prejuízo direto ao empregado.
“Há situações em que o funcionário mudou de cidade ou passou a cuidar de dependentes com base no modelo remoto. Nesses casos, o empregador precisa oferecer alternativas de adaptação ou discutir o retorno em comum acordo”, reforça Vallory.
Tendência global de reequilíbrio
A decisão do Nubank acompanha uma tendência mundial de reaproximação dos escritórios. Grandes empresas, como Google e Amazon, já vêm exigindo presença mínima semanal, alegando queda no engajamento e na inovação durante o trabalho remoto prolongado. No Brasil, bancos, companhias de tecnologia e setores administrativos também revisam o home office integral, buscando um modelo híbrido mais estruturado.
Para Vallory, o movimento é legítimo, mas requer planejamento.
“As empresas têm autonomia para rever suas políticas, desde que garantam condições adequadas de trabalho, equipamentos e tempo hábil de transição. O problema surge quando isso ocorre de forma unilateral, sem diálogo com os trabalhadores”, afirma.
Direitos e lacunas jurídicas
A especialista lembra que políticas de retorno também devem observar legislações específicas, como o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), além de normas que garantem tratamento diferenciado a pais e responsáveis por crianças pequenas.
“O modelo híbrido veio para ficar, mas ainda exige maturidade jurídica. A pressa em reverter o home office pode gerar insegurança e custos desnecessários às empresas”, conclui.
