João Batista Dallapiccola Sampaio – “Dia do bancário: a importância socioeconômica e a tutela jurídica”

A figura do bancário é um dos pilares invisíveis, porém essenciais, da estrutura socioeconômica moderna. Muito além do atendimento ao público e da movimentação de valores, este profissional é o operador direto do sistema financeiro, complexa rede que sustenta o comércio, a indústria e a vida pessoal de milhões de cidadãos.

A celebração do Dia do Bancário, mais do que uma data comemorativa, é um marco histórico e jurídico que simboliza a longa luta por melhores condições de trabalho e o reconhecimento da singularidade desta profissão. Este artigo tem por objetivo analisar a origem e importância da profissão bancária, perpassando pela consolidação de seus direitos jurídicos específicos, amparados por uma vasta legislação especial, doutrina e jurisprudência trabalhista. Trata-se de um estudo que demonstra como o direito, nas palavras do sociólogo Max Weber, é um instrumento de racionalização e proteção das relações sociais complexas do capitalismo moderno.

O Dia do Bancário é celebrado em 28 de agosto no Brasil. Esta data não foi escolhida aleatoriamente, mas sim como coroamento de uma das primeiras e mais significativas greves da categoria, iniciada em São Paulo, precisamente em 28 de agosto de 1951. Na esteira do processo de industrialização e urbanização do país, os bancários reivindicavam melhores salários e a redução da jornada de trabalho, que chegava a exaustivas 12 horas diárias.

O sucesso do movimento, que se espalhou por outros estados, resultou na conquista de direitos fundamentais e eternizou a data como um símbolo de resistência e organização sindical. A origem da data, portanto, está intrinsecamente ligada à conquista de direitos, demonstrando a força da coletividade na busca por um equilíbrio nas relações de trabalho, um princípio basilar da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

A importância do bancário transcende a esfera individual do contrato de trabalho. O bancário é, portanto, um agente central nesse sistema, responsável por operacionalizar o crédito, as poupanças, os investimentos e os pagamentos que viabilizam toda a atividade econômica. Contudo, essa posição central implica em riscos peculiares e intensos, que justificam a proteção legal especial.

São profissionais submetidos a uma pressão constante por metas, ao risco de assaltos e sequestro relâmpago (cárcere privado), ao estresse do manuseio de grandes quantias (com a responsabilidade civil inerente) e, na modernidade, à pressão psicológica da alta competitividade e da digitalização. Essa exposição a agentes físicos, químicos, biológicos e, principalmente, psicossociais, caracteriza a hiper-riscosidade da profissão, um conceito doutrinário que fundamenta a existência de um regime jurídico diferenciado.

O ordenamento jurídico brasileiro, atento a essas peculiaridades, criou um microssistema de proteção ao bancário. A base legal principal é a Lei nº 4.090/1962, que instituiu o adicional de periculosidade para os empregados em instituições financeiras, e a Lei nº 5.760/1971, que consolidou e ampliou esses direitos.

Os principais direitos específicos assegurados são, por exemplo, o adicional de Periculosidade: Previsto no art. 193 da CLT e regulamentado pela Lei nº 4.090/62 e pela NR-16, é devido pelo manuseio de valores (dinheiro, títulos, etc.) que expõe o empregado a risco de roubo ou violência física. É fixado em 30% sobre o salário base, sem acréscimo de gratificações, prêmios ou participação nos lucros.

A jornada de trabalho reduzida também é prevista na Lei nº 5.760/71, que estabeleceu a jornada de 6 horas para os funcionários que exercem atividades exclusivamente em agências ou casas bancárias. Para os que trabalham em tesouraria ou câmbio, a jornada é de 7 horas. A Súmula nº 269 do TST corrobora que a jornada de 6 horas é inderrogável, salvo por acordo de prorrogação.

Além desses direitos legais, as Convenções Coletivas de Trabalho (CCT) celebradas anualmente pelos sindicatos da categoria são fontes extremamente importantes, conquistando benefícios como auxílio-creche, plano de saúde, vale-refeição, e pisos salariais superiores ao piso nacional, demonstrando a vitalidade da negociação coletiva, instrumento defendido por doutrinadores como Amauri Mascaro Nascimento.

A trajetória do bancário no Brasil é a narrativa de uma categoria que, consciente de seu papel estratégico e de sua vulnerabilidade, organizou-se para forjar um conjunto de direitos que servem de dique de proteção contra os riscos inerentes à sua atividade. Do marco histórico de 28 de agosto de 1951 às robustas garantias das Leis nº 4.090/62 e 5.760/71, o que se observa é um constante diálogo entre a luta social e a resposta do Direito. A legislação especial bancária não é um privilégio, mas uma necessária compensação pelos riscos profissionais específicos, um conceito que encontra eco na filosofia de John Rawls sobre a justiça como equidade, que busca corrigir, por meio de instituições, as desigualdades geradas pelas contingências sociais. Assim, ao celebrar o Dia do Bancário, celebra-se não apenas uma profissão vital, mas a própria efetividade do Direito do Trabalho em equilibrar a relação capital-trabalho e em garantir que, nas palavras do artigo 7º da Constituição Federal de 1988, haja redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. O bancário, portanto, é um operário de colarinho branco, cuja caneta, outrora de pena, hoje digital, é respaldada por uma poderosa caneta jurídica que garante sua dignidade.

*Escrito pelo advogado João Batista Dallapiccola Sampaio, em conjunto com a advogada Eliane Antônia de Melo.

*A opinião dos articulistas é de total responsabilidade dos autores e não reflete necessariamente a posição do portal News Espírito Santo.

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Diretor de conteúdo – Eduardo Caliman

Jornalista formado pela Ufes (1995), com Master em Jornalismo para Editores pelo CEU/Universidade de Navarra – Espanha. Iniciou a carreira em A Tribuna e depois atuou por 21 anos em A Gazeta, como repórter, editor de Política, coordenador de Reportagens Especiais e editor-executivo. Foi também presidente do Diário Oficial, subsecretário de Comunicação do ES e, de 2018 a 2024, coordenador de comunicação institucional no sistema OAB-ES/CAAES.

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