O impeachment é um instrumento jurídico e político previsto na Constituição Federal brasileira que tem por objetivo responsabilizar e punir autoridades que cometem crimes de responsabilidade. Apesar de seu nome remeter à esfera judicial, o impeachment não é conduzido exclusivamente pelo Poder Judiciário, mas sim por um processo político-jurídico que envolve os Poderes Legislativos e, em determinadas fases, o Judiciário. Em essência, o impeachment representa uma forma de controle constitucional exercido sobre os detentores de cargos públicos de alta hierarquia, como o Presidente da República, governadores, ministros de Estado e ministros do Supremo Tribunal Federal.
O contexto histórico do impeachment
O instituto do impeachment tem raízes históricas no direito anglo-saxão, especialmente na Inglaterra do século XIV, como um mecanismo do Parlamento para controlar abusos cometidos por oficiais da Coroa. Nos Estados Unidos, foi incorporado à Constituição como uma ferramenta de equilíbrio entre os poderes. O Brasil, por sua vez, herdou essa tradição e consolidou o impeachment na Constituição de 1891, com previsão expressa para responsabilização do Presidente da República em caso de crimes de responsabilidade. A atual Constituição de 1988 manteve e ampliou esse instrumento.
Na história republicana brasileira, dois processos de impeachment marcaram significativamente a vida política nacional: o do presidente Fernando Collor de Mello, em 1992, e o da presidente Dilma Rousseff, em 2016. Ambos os casos envolveram a acusação de crimes de responsabilidade e foram julgados pelo Senado Federal após autorização da Câmara dos Deputados, conforme previsto no artigo 86 da Constituição Federal e regulado pela Lei nº 1.079/1950, que define os crimes de responsabilidade e estabelece os procedimentos do processo de impeachment.
O procedimento constitucional para o impeachment
O procedimento de impeachment inicia-se com a apresentação de uma denúncia escrita por qualquer cidadão, que deve ser recebida pela Câmara dos Deputados. Essa denúncia deve conter a exposição dos fatos e suas provas. Caso seja admitida pela presidência da Câmara, ela é submetida ao plenário, que deve aprová-la por no mínimo dois terços de seus membros (342 deputados).
Se aprovada, a autoridade que está sendo submetida ao impeachment é afastada temporariamente de suas funções por até 180 dias, período durante o qual o Senado Federal julga o processo. O Senado, ao receber a denúncia aprovada, assume o papel de tribunal político, conduzindo o processo com garantias mínimas ao acusado, como direito à ampla defesa e ao contraditório. Na fase final, realiza-se uma sessão presidida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, quando se trata do impeachment do presidente da República. Para que haja a condenação e, consequentemente, a perda do cargo, são precisos os votos de dois terços dos senadores (54 dos 81). A pena aplicável é a perda do cargo e a inabilitação por até oito anos para o exercício de qualquer função pública.
As repercussões e consequências
É importante destacar que o impeachment é um processo político-jurídico. Não se confunde com um processo penal comum, pois não necessariamente exige prova de crime no sentido estrito penal, mas sim da prática de atos que atentem contra a Constituição, as instituições democráticas ou o erário público, por exemplo.
Contudo, a pessoa que sofre o impeachment pode, paralelamente, responder a processo criminal no Supremo Tribunal Federal, se for o caso, dependendo do foro por prerrogativa de função. A consequência direta para quem sofre o impeachment é a perda do mandato e, em regra, a inabilitação por até oito anos para o exercício de função pública.
O afastamento definitivo do cargo implica que a linha sucessória constitucional seja acionada. No caso do presidente da República, por exemplo, assume inicialmente o vice-presidente. Se este também estiver impedido, o presidente da Câmara dos Deputados assume interinamente, seguido pelo presidente do Senado e, por fim, pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, até que novas eleições sejam convocadas.
Portanto, há de se considerar que o impeachment é uma ferramenta essencial de proteção à ordem constitucional e democrática, permitindo que a sociedade, por meio de seus representantes, responsabilize autoridades que abusam de suas funções ou violam princípios fundamentais. Apesar de seu conteúdo jurídico, é um processo que envolve forte carga política e que requer equilíbrio, responsabilidade institucional e respeito ao devido processo legal, para não ser utilizado como instrumento de perseguição, mas sim de preservação da República.
*Escrito pelo advogado João Batista Dallapiccola Sampaio, em conjunto com os advogados Marcelo da Silva Henriques, Valmir Castro Alves, Advogados.
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