Numa regata, um bordo, a direção do veleiro, se torna perdido quando continuar nele não traz mais nenhum ganho nem de vento, corrente ou posição na competição. Um bordo perdido é aquele em que o vento, o rumo e a posição relativa não rendem mais, os concorrentes passam na frente e então é preciso mudar de bordo antes que o prejuízo aumente. Um bom velejador não muda de bordo só porque está atrás, mas quando detecta mudanças de vento e perspectivas de alcance de marcas na raia da competição com o novo bordo.
Aprendi com Luiz Carlos Azedo e Paulinho da Viola usar a navegação como metáfora da vida e da política. O bolsonarismo é um bordo perdido para a oposição ao projeto Lula 4. A diferença entre desaprovação e aprovação do governo saiu de 17 pontos percentuais no início do ano para apenas um ponto na última pesquisa da Quaest. A estratégia de radicalização contra o STF e o envolvimento de Donald Trump com sanções e ameaças antes, durante e depois do julgamento de Jair Bolsonaro funcionaram exatamente ao contrário do pretendido.
Um novo bordo não é um novo mito. Deve ser um projeto para o Brasil capaz de competir com a esperança emanada pela força do governo do PT. Uma agenda verdadeira formada pelas questões estruturais do país que são empurradas com a barriga pelo oportunismo mal disfarçado em pragmatismo eleitoral dos políticos de todo o espectro ideológico, em sua maioria de extração extrativista, que alimentam a descrença da população nas instituições da democracia.
Uma agenda do interesse nacional começa com uma estratégia crível para o desequilíbrio fiscal e reordenamento do sistema orçamentário; uma proposta para a segurança pública e o combate ao crime organizado; pactuar a reforma administrativa, uma estratégia para as cidades e para o pacto federativo e para uma reforma do sistema político-eleitoral. Um projeto de desenvolvimento que articule e potencialize os ativos produtivos, ambientais, culturais e históricos do Brasil. Um projeto de quem acredita que o Brasil tem concerto. Um projeto de nação.
Colocar a oposição em um novo rumo não é manobra fácil. Lula se fortaleceu e hoje sua reeleição é o cenário de maior probabilidade. No entanto, haverá uma disputa que não vai ser decidida por WxO. O mercado político opera trazendo a valor presente diariamente uma aposta sobre quem vai ganhar a eleição e quem detém a força da expectativa de poder. Como no mercado financeiro, todo dia alguém vence e alguém perde. Comprados ou vendidos.
O calendário eleitoral e a realidade das eleições nos estados da federação e por cadeiras no Congresso Nacional vão aos poucos mostrando que o bolsonarismo é bordo perdido e fato irreversível. Contudo, sua influência continua a ser predominante na oposição, agarrada ao bordo perdido, dividida e confusa. A derrota do governo na votação das medidas de aumento de impostos para compensar as perdas de arrecadação da isenção de IR para quem ganha até R$ 7 mil mostra que as escolhas num barco sem rumo não possuem alternativa 100% certa. Aprovar o pacote do governo para remendar a crise fiscal crônica e mostrar que não aposta no quanto pior melhor ou derrotá-lo aprofundando o quadro financeiro deficitário para cobrar um debate mais profundo sobre o desequilíbrio nas contas e de quebra trazer dificuldades políticas adicionais ao governo? A Câmara votou pela segunda opção. O governo diz que a oposição derrotou não o governo, mas o povo brasileiro. O Brasil vive sem plano de navegação, disputando o rumo na boca do caixa.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, favorito a timoneiro da oposição, ficou exposto à manobra desesperada do bolsonarismo que trouxe Donald Trump para a disputa política no Brasil. Anunciou que vai disputar a reeleição em São Paulo, mas articulou no Congresso a derrota do governo na MP do aumento da arrecadação. Os dois ministros do centrão decidem não sair do governo como determinaram os caciques partidários. Os sinais embaralhados mostram o barco da oposição sem rumo e o fortalecimento do projeto Lula 4.
Esta prova está apenas começando. O barco do governo lidera e o veleiro oposicionista vai ter que se livrar do vento sujo, abandonar o bordo perdido para ter chance de recuperar posições e voltar a sonhar com a fita azul.
*Luiz Paulo Vellozo Lucas é engenheiro de Produção e professor universitário. Mestrado em Desenvolvimento Sustentável. Ex-prefeito de Vitória-ES e ex-deputado federal pelo PSDB-ES. Membro da ABQ – Academia Brasileira da Qualidade.
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