Decisão reafirma a autonomia das Cortes de Contas para aplicar multas e exigir ressarcimentos, sem depender de julgamento pelas Câmaras Municipais
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, que os Tribunais de Contas têm competência para julgar e aplicar sanções a prefeitos que atuem como ordenadores de despesa — ou seja, que assinam contratos, executam orçamentos e conduzem licitações — sem necessidade de aprovação posterior pelas Câmaras Municipais. A decisão foi tomada no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 982, proposta pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon).
A ação questionava a prática de Tribunais de Justiça que vinham anulando multas e imputações de débito impostas por Tribunais de Contas a prefeitos, sob o entendimento de que apenas os Legislativos locais poderiam julgá-los. O STF corrigiu essa interpretação, esclarecendo que a análise técnica e a responsabilização administrativa e financeira são atribuições exclusivas dos Tribunais de Contas.
Na prática, a Corte estabeleceu três pontos principais:
– Prefeitos que atuam como ordenadores de despesa devem prestar contas diretamente aos Tribunais de Contas;
– Os Tribunais podem julgar essas contas e aplicar sanções, como multas e ressarcimento ao erário, em caso de irregularidades;
– As Câmaras Municipais seguem competentes para julgar as contas de governo — aquelas que tratam da execução orçamentária e das políticas públicas — com base no parecer prévio das Cortes de Contas, o que pode gerar efeitos eleitorais como inelegibilidade.
O presidente do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES), conselheiro Domingos Taufner, afirmou que o novo entendimento do STF reforça o equilíbrio entre a análise técnica e o julgamento político.
“Com esse entendimento, protege-se a autonomia e a autoridade técnica das Cortes de Contas para coibir eventuais desvios na aplicação de recursos públicos e exigir reparação aos cofres públicos, e ao mesmo tempo, se mantém o papel legítimo do Poder Legislativo para avaliar a dimensão política das contas anuais”, afirmou Taufner.
O secretário-geral das Sessões do TCE-ES, Odilson Barbosa Júnior, ressaltou que a interpretação do STF está alinhada à prática já adotada pela Corte capixaba.
“Encaminhamos apenas as contas de governo ao Legislativo, para que ele julgue a capacidade política do gestor. Já as contas de gestão, inclusive as anuais, são julgadas pelo Tribunal de Contas, que tem competência para aplicar sanções e reparações por dano ao erário”, explicou.
Efeitos eleitorais
O STF também reafirmou que, conforme a Lei de Inelegibilidades (Lei Complementar nº 64/1990), a rejeição das contas de governo — e não de gestão — pode levar à inelegibilidade, mas somente após decisão final da Câmara Municipal. Mesmo com a desaprovação das contas, cabe à Justiça Eleitoral decidir se o gestor está, de fato, inelegível.
Mudança de entendimento
A decisão representa uma mudança importante em relação ao entendimento firmado em 2016 pelo próprio STF, em repercussão geral, de que apenas os Legislativos locais poderiam julgar as contas de prefeitos — o que gerou decisões judiciais que anularam punições técnicas aplicadas pelas Cortes de Contas.
Para reverter esse cenário, a Atricon recorreu ao Supremo, que agora consolidou, por unanimidade, a competência técnica dos Tribunais de Contas para julgar atos de gestão, aplicar sanções administrativas e assegurar o ressarcimento de recursos públicos em caso de irregularidades.
Informações: TCES